Espaço aberto
Arquitetos se inspiram nos lofts e criam projetos para solteiros e descasados


Foto: MAX PINTO


Ethel Carmona no galpão reformado: móveis artesanais e atmosfera mágica

CHANTAL BRISSAC

Loft (subst.): sótão, galpão de fábrica, depósito. Lofty (adj.): alto, sublime, imponente. Os termos em inglês traduzem um estilo de construção que se caracteriza pela amplidão de ambientes, o pé direito alto e os vãos livres. Não há portas a atravessar nem paredes a dividir. Há, sim, visão e domínio total sobre o espaço, uma sensação deliciosa para quem mora sozinho. E um cenário inteiro, alto e aberto, para aproveitar como quiser.

Os lofts surgiram nos últimos 40 anos em cidades como Nova York, Londres e Paris. Arquitetos, artistas plásticos e escritores passaram a usar os velhos prédios concebidos para abrigar fábricas, armazéns, docas e garagens como residência ou local de trabalho. Algumas décadas antes eles já eram adotados como estúdios e ateliês pela intelligentsia da época. O pintor impressionista Claude Monet trabalhou na série das ninféias em um loft na cidade de Giverny, entre 1916 e 1922. Mas foi só depois dos anos 70 que morar em loft virou moda. Houve a partir daí um movimento de restauração, que tornou bairros inteiros, como o nova-iorquino SoHo, chamarizes para a classe média descolada.

Hoje, em cidades como São Paulo, o conceito loft está em alta. "As pessoas estão começando a valorizar mais a integração dos espaços", diz o arquiteto Roberto Migotto, que projetou para a mostra Artefacto um elegante loft de 60 m2, idealizado para um jovem empresário. Com a ausência de antigos galpões industriais nas áreas centrais - eles se localizam mais na periferia - , a opção tem sido readaptar apartamentos usando essa referência. Prédios erguidos em uma época em que o espaço era mais valorizado do que o número de dormitórios ou vagas na garagem são os mais procurados, especialmente por profissionais liberais, solteiros ou descasados, e casais sem filhos. Há também uma tentativa de ampliar as alternativas do mercado imobiliário, atualmente voltado para apartamentos com vários ambientes, mas todos microprojetados. É o caso dos anúncios que falam de três ou quatro dormitórios, mais sala de estar, mais sala de jantar, mais lavabo, mais escritório, mais terraço, mais hall etc. Para o arquiteto João Armentano, esse produto não agrada o consumidor e costuma ser extremamente caro. "Fora isso, o pé direito é muito baixo, de 2,40 m, ou seja, 20 centímetros acima de uma porta normal. Foi por causa dessa insatisfação que resolvi, com um grupo de empresários, construir novas edificações com o conceito loft, que, além de amplo e confortável, é econômico", diz o arquiteto.

O primeiro edifício será erguido no Jardim Guedala, na zona sul de São Paulo, com apartamentos de 110 metros quadrados e pé direito de cinco a seis metros. "Nosso plano é construir cinco prédios com essa filosofia nos próximos anos", diz o empresário Luciano Huck, sócio no empreendimento. O preço médio é R$ 150 mil. Com a fachada em concreto, grandes janelas e tubulação aparente, ele terá a cara de um autêntico loft, mas toda a estrutura de serviços de um prédio moderno. "Cada andar vai ter uma lavanderia e uma máquina de gelo para socorrer os solteiros e afins", revela Huck. As novas formações familiares têm sido objeto de interesse de arquitetos como Mauro Munhoz, que lançou recentemente um condomínio horizontal no bairro paulistano de Campo Belo, segundo ele um exemplo de casas-lofts, por causa do pé direito de 5,20 m e da ausência de paredes. A estrutura foi pensada para possibilitar alterações do espaço interno, de acordo com a vida dos moradores. Um casamento, a chegada dos filhos, uma separação, talvez um novo casamento são fatos previstos tecnicamente na construção.

Descasado há pouco tempo, o empresário Isaac Duek, 45 anos, sócio da Forum, optou em fazer de um antigo apartamento o loft dos seus sonhos. Três quartos foram transformados em um enorme para Isaac, com pé direito duplo. Na cobertura não há divisões entre a piscina aquecida, o home theatre e a academia de ginástica. "Não quero mais sair daqui. É bom demais", diz Isaac. Este é o mesmo sentimento experimentado por quem visita o showroom de Ethel Carmona no bairro de Pinheiros. Proprietária de uma marcenaria artesanal, espécie de alta-costura em madeira de lei, ela reformou com o arquiteto Paulo Milani, em três meses, um depósito de 400 metros quadrados, aproveitando as tubulações e estruturas do teto, e fez do local um ponto de referência

ISTOÉ - Espaço aberto - 18/06/1997